12.9.10


(...) gozo do "fútil" (lat. fundo - que se derrama, que nada segura). Em suma, delicadeza: a análise (lýo* > desatar) que não serve para nada
* verbo grego que significa também "dissolver, resolver, explicar"

(...) Não "traços", "elementos", "componentes", mas o que brilha por clarões, em desordem, fugazmente, sucessivamente, no discurso "anedótico": tecido de anedotas do livro e da vida

(...) Arte = prática fina da diferença: não tratar os objetos do mesmo modo: tratar o aparentemente mesmo como diferente

(...) discernare

(...) eliminação de toda e qualquer repetição: a delicadeza horroriza-se, melindra-se com repisamentos

(...) a) Walter Benjamin, em Marselha, experimenta H; vai ao restaurante Basso e fica em dúvida diante de vários pratos: "não por gula, mas por expressa polidez para com os pratos, por medo de melindrá-los, recusando-os". b) Isto, que é uma viravolta admirável, por delicadeza = pois delicadeza doutrinal: doutrina Tao sobre a imortalidade do corpo (alma =/= corpo: dicotomia ocidental): é o corpo que deve ser imortal. Imortalidade: conservação do corpo vivo. Ao longo da vida, é preciso ir substituindo o corpo mortal por um corpo imortal, fazendo nascer em si órgãos imortais que substituem os órgãos mortais. No entanto, desmentido imediato dos fatos: evidente que todos morrem. "Para não causar perturbação na sociedade humana em que a morte é um acontecimento normal, quem se tornava imortal fingia ter morrido e era enterrado normalmente: o que se punha na urna funerária era uma espada ou um cajado ao qual ele dera aparência de cadáver; o verdadeiro corpo partira para viver entre os Imortais = "a Libertação do Cadáver". Admirável consideração pelos outros, delicadeza pura: fazer de conta que morreu para não chocar, ferir, embaraçar os que morrem

(...) destacar um traço e fazê-lo proliferar em linguagem (...) a língua cria o real; quem escolhe sua língua escolhe sua realidade

(...) Princípio de delicadeza: interstício absoluto do conformismo e da moda

(...) Esse estado amoroso "afastado" do querer-agarrar pode gerar todo um complexo de valores-sensações que os japoneses (sobretudo no que se refere ao haicai e ao Zen) chamaram de sabi: "simplicidade, naturalidade, não-conformismo, refinamento, liberdade, familiaridade estranhamente mitigada com desinteresse, banalidade cotidiana requintadamente velada de interioridade transcendental"

fragmentos acerca da figura Delicadeza em O neutro, de Roland Barthes.

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