9.7.12



Não havia pensado nisso antes, mas agora parece haver uma ligação forte com o ruído e as sombras dos filmes do Pedro Costa. O jogo de luz e sombra (Low life tem como saldo um filme em preto e branco) é uma maneira de dar visibilidade às oposições e suas variações, especialmente sonoras. Ne change rien é um exemplo nesse sentido, prezando o som direto assim como as sombras diretas. Como se usa a escuridão em Low life? Ela vai no sentido de tornar visível a oposição ou afunda os corpos num pântano? Me vem à cabeça WB e a imagem da criança que deixa o livro coberta pela neve da leitura. Talvez aqui a neve dê lugar às sombras: levantamos e as sacudimos; mas é preciso notar também que os cristais de neve derretem no sol, enquanto que as sombras se acirram ao fugir dele.

E talvez a temporalidade que decorra desse espaço sombrio seja a do esgarçamento e da ruptura, pois poucas vezes nos deparamos com a escuridão e a vigília simultâneos: surge a hipótese de que a escuridão dure para sempre. No escuro o tempo se torna visível porque o vemos correr organicamente, sem ser ofuscado pela Cultura. Os Straub disseram certa vez: Sua namorada é bela por todos os lados, mas você só pode olhá-la de um. Daí o fascínio por blecautes e incêndios: quando nos parece que a mudança é realmente possível. Então filmar a escuridão tem um princípio ético muito próprio: é aqui que nasce outro ângulo, portanto é aqui que precisamos registrar. Ruína.

Se um dia eu precisar fazer um filme, uma trama: acabou a luz na cidade. As relações de classe decorrerão daí, como no conto de Mário de Andrade, O ladrão.



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