26.12.10

anexo:


Afortunados os tempos para os quais o céu estrelado é o mapa dos caminhos transitáveis e a serem transitados, e cujos rumos a luz das estrelas ilumina. Tudo lhes é novo e no entanto familiar, aventuroso e no entanto próprio. O mundo é vasto, e no entanto é como a própria casa, pois o fogo que arde na alma é da mesma essência que as estrelas; distinguem-se eles nitidamente, o mundo e o eu, a luz e o fogo, porém jamais se tornarão para sempre alheios um ao outro, pois o fogo é a alma de toda luz e de luz veste-se todo fogo. Todo ato da alma torna-se, pois, significativo e integrado nessa dualidade: perfeito no sentido e perfeito para os sentidos; integrado, porque a alma repousa em si durante a ação; integrado, porque seu ato desprende-se dela e, tornado si mesmo, encontra um centro próprio e traça a seu redor uma circunferência fechada. "Filosofia é na verdade nostalgia", diz Novalis, "o impulso de sentir-se em casa em toda parte". Eis por que a filosofia, tanto como forma de vida quanto como a determinante da forma e a doadora de conteúdo de criação literária, é sempre um sintoma da cisão entre interior e exterior, um índice da diferença essencial entre eu e mundo, da incongruência entre alma e ação. Eis porque os tempos afortunados não têm filosofia, ou, o que dá no mesmo, todos os homens desse tempo são filósofos, depositários do objetivo utópico de toda a filosofia. Pois qual a tarefa da verdadeira filosofia senão esboçar esse mapa arquetípico?
Lukács, A teoria do romance


Algo se esboça. É dificultoso sincronizar duas coisas que na verdade não são separáveis. Uma aporia constante. Língua bestial que se apóia no puzzle: separaram o inseparável, resta-nos juntá-loE seguindo de mãos dadas até o fim do bosque, encontramos inscrito no solo aquilo que nos perguntávamos no início da caminhada:


E se alguém dissesse, em sonhos, "estou 
dormindo" -- diríamos que "tem toda a razão"?
L. Wittgenstein, Zettel, 396


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