5.6.11


2) O NEUTRO COMO ESCÂNDALO

Não é difícil ver qual é o fundo dessas imagens ruins. Lembremos: historicamente, o espaço "oficial" do neutro é o ceticismo, ou discípulos de Pírron: zetéticos (estão sempre procurando), céticos (examinam sem encontrar), eféticos (suspendem o juízo), aporéticos (sempre incertos); portanto, sempre imagens de fracasso, impotência. > O Neutro sofre sob o peso (a sombra) da gramática: = o que não é masculino nem feminino, ou (verbos) o que não são ativos nem passivos (= depoentes) = o que está retirado da genitalidade, o que não é viril nem atraente (feminino); sabe-se, miticamente, endoxalmente, infâmia indelével > não nos cabe tomar partido contra essa imagem (ou então, é o curso inteiro que é essa oposição, não protestamos contra uma imagem, não adianta nada). O que se pode fazer é derivar, deslocando o paradigma. > no lugar da "virilidade" ou da carência de virilidade eu poria a vitalidade. Há uma vitalidade no Neutro: o Neutro brinca no fio da navalha: no querer-viver, mas fora do querer-agarrar > penso no final do poema de Pasolini já citado (Poesia in forma di rosa, Garzanti, 1964), capítulo V, IX:

"Deus meu, afinal que tem o senhor no ativo? –– Eu? (Um balbucio abominável, não tomei optalidon, treme a minha voz de menino doente.) Eu? Uma desesperada vitalidade."

["Dio mio, ma allora, cos'ha lei all'attivo? –– Io? (Um balbettio nefando, non ho presso l'optalidon, mi trema la voce di ragazzo malato.) Io? Una disperata vitalità."]


trecho acerca da figura Imagens do Neutro em O Neutro, de Roland Barthes

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