20.3.10


aquela coisa
de sonho
até acordar.

La chambre
Chantal Akerman
1972

13.3.10

os dorminhocos

fábrica de ruína
beast language
ignição !

19.2.10

lembrete:

Antonioni rasgando o pó do capitalismo. Se adiantou e filmou a Bolsa de Valores, talvez não tenha mais sentido filmá-la aqui e agora, mas vamos ver o andamento das coisas, ainda que duvide de alguma evolução entre 1962 e 2010, no sentido estrito de evoluir. Mas não foi só essa decepção boa em ver planos já filmados, mas a impressionante construção do espaço-ao-redor das pessoas, que já começa com o vento (o ar em movimento, como dizíamos na escola) na cara da Vitti, uma tatibilidade que nunca vi além de Faces, mas dessa vez mais pela física das coisas, do que pelo amor que elas emanam. E esse redor na sequência final é um troço assombroso, de repente não há mais personagens - ainda que haja pessoas - e o que sobram são as sobras espaciais, que na verdade são em sentido inverso, pois as sobras são as personagens, ou nós, ou Antonioni, rodeados daquele vento, daquela gritaria da Bolsa, daquele fracasso em todas as ações. Engraçado, não é metafísico, ao contrário, e faz isso de um jeito tão bonito que é de chorar, um choro muito mais... físico, do que qualquer choro clássico de plot que todas as histórias de casais no cinema irão poder fazer. Talvez esse anti-espetáculo seja apenas outra forma de espetáculo, que não nega o outro, mas afirma um infinitamente superior, que chega a ser constrangedor compará-los, restando apenas rebaixá-lo como louco e chato.

O vazio é vazio, mas está pelo cheio, pra quando vier, pra quando sobrar. Como podemos ser tão ingênuos em confiar em nossos olhos quando E=mc² está aí há bastante tempo e toda essa energia que sentimos ao nosso redor, esse amor imenso? Abaixo dessas frequências existem outras e outras e acima idem. Como duvidar do invisível? Como não duvidar do visível?

Personagens ainda podem existir. Olhar relativo.

Uma cócega.


sobre O eclipse, 1962

28.1.10

lembrete:
borrão sem bordas
consciência como acidente da matéria
olhando ao redor de si mesma

lápis papel tesoura

ontologia da areia

e numa carta de amor
"desejávamos flutuar"

castigo do eterno despertar
a doença do sono

voltando com as garrafas, Sarte -
"nunca parecia ser um homem só, tinha a vida lenta, silenciosa e murmurante de uma multidão".

22.1.10

sobre o desrespeito de nós em função da trama


Duas caras. Uma mulher aos olhos de um homem que há muito desistiu do sexo. Curioso. Desse plot só se pôde decupar os significados mudos. O homem estava amarrado, então amarrou-se a imagem da mulher.

Como nós revoltados de uma trama oca, surge o turbilhão. Perseguição metafísica com bônus carnal, afinal, Kim Novak. Pendurada no quadro de seus desejos. Apertada à distância de um close. Nada se diz, porque não se sabe o que dizer, e isto - é o máximo.

E os desejos, curiosamente, são engraçados. O eterno tableaux do me ame, me ame. A fraqueza feminina é diferente da masculina, indecifrável aos olhos formais do tesão. Troque, coloque, tire, e fique loura. Representar o irrepresentável? Ou representar apenas? Ou meramente representar as penas?
Gosto de Midge, que sangra a sua maneira.


E o que sobra é o recorte mudo, de algo que não se compreende e o final do filme diz isso subterraneamente, quando precisa matar aquilo de que não consegue mais extorquir amor. É necessária essa eterna separação para o homem manter seus ideais e amores. Mata-se Kim Novak, e isso, definitivamente, está errado.

sobre Vertigo, 1958, Hitchcock

21.1.10

lembrete:

para investigar as entrelinhas,
os caminhos de liberdade,
como que Faulkner num agora posso simplesmente escrever,

para pesquisar uma prática,
pois assim já não dá mais, já nunca deu mais, já nunca dará mais,
pois é assim que se cadencia,
sem inseticidas,
com metamorfoses,
gritando a toda, nas mais silenciosas -
seu corpo é sua novidade!

um dorminhoco que não acorda na hora,
-isso vai longe demais

toc, toc,
batem à porta,
e nego a me levantar.

14.1.10

lembrete:

dormir é botar a razão de molho
retardado mental
sintaxe
na biblioteca de seus lábios.

25.12.09

"To make God laugh, tell him your plans."

12.12.09

VIII. Os rebatedores


lembrete²:
inúmeras estrelas silenciosas.
. ecoa. conosco.
luz de aço.
imã de conversas infinitas.

o universo só se vê aproximando a cara,
coragem de deixar de-ver tudo ao mesmo tempo,
destotalizando a verdade, permitindo que ela
minta
inutilidade
pulsante.

10.12.09

VII. Os rebatedores


O tableaux rebelde

O reflexo no espelho em cima da mesa onde figuras prototípicas conversam talvez seja o ponto de torque em que se baseie Imitation of life. Escondido como um Wally em meio ao tableaux intrigante que compõe a imagem, o caráter autônomo desse reflexo injustificado pela diegese, ao não necessitar de corpo presente para existir (a princípio achamos que é o reflexo da garota ruiva, mas logo percebemos que não o é, havendo confusão de direções), cria um efeito de estranhamento, sutil vertigem, que nos leva a considerar se aquele não seria o nosso próprio reflexo, do espectador detentor do ponto de vista.

Esta tele-visão, olhar à distância, nos desperta para o tubo catódico que veicula tais imagens, as imagens do videoclipe em sua constituição e construção. Para sublinhar tal olhar distanciado vemos através de um zoom que analisa a superfície da imagem denotando, por sua repetição, a tentativa de compreensão do que é visto. A repetição de instantes já "vistos", ou melhor dizendo, já "vividos" nas periferias da imagem instaura de vez o caráter reflexivo de mostração e demonstração de um pensamento em fluxo corroborado pela música. Este efeito produzido explicitamente na edição, portanto sem a espontaneidade do instante, permite que os acontecimentos encenados não se resumam a meros fatos, a meras narrativas, pois o zoom "pinça" potenciais plots que nunca se realizarão para, de fato, apreciá-los criticamente. Nesse ensaísmo a superfície se torna tecido infinito à costura do pensamento.

A obra possui, portanto, uma "moldura" temporal na qual não é permitido avançar linearmente, mas apenas penetrar, cada vez mais, na superfície, no significado da imagem e do som (a música, arte do tempo, é potencializada pela repetição visual que permite determinadas estrofes se realocarem sobre novos contrapontos imagéticos), como se quisesse nos engolir no turbilhão do instante adiado. Porém, não se trata da descontinuidade "progressiva" do espaço-tempo comum aos videoclipes, mas sim do provocante adiamento do contiunuum que o tableaux (todos juntos a uma passada do olhar) e a música (harmônica e contínua) sugerem existir. Percebemos então a rebeldia formal: quando temos o tableaux vivant, assimétrico, nos remetendo à composição barroca, o zoom-pinça-analítica rompe com a “desorganização” nos aproximando de uma “organização” pictórica pontual e "harmônica", individualizante, devedores aos enquadramentos clássicos e, porque não, hollywoodianos.

Nesse sentido, há a crítica subterrânea da totalização e banalização desse código dito clássico. Se fizermos uma comparação da repetição dos instantes do videoclipe através da edição com a montagem paralela de Griffith, podemos intuir uma busca pela Verdade tipicamente ocidental, na qual a própria "decupagem" dos "planos" (já questionável na medida em que o videoclipe trabalha em “zonas”) busca ver "tudo" da "melhor" maneira, de modo a esgotar seu significado, enterrando todas as conclusões formuladas por um espectador ativo. Trabalhando ironicamente esse esgotamento em direção à Verdade absoluta, o vídeo implode e explode a cada verso musical tal totalização: é impossível abarcar o mundo, ainda que repetindo incansavelmente meros 20 segundos de captação. A potência estética de Imitation of life vem dessa articulação referencial que passa da decupagem clássica e totalizante, ao american way of life, que da mesma maneira lapida a sociedade com limites bem delineados: o homem negro não deve tocar a mulher branca.


Podemos afirmar a partir dessa intuição um tratamento estético-político antiespetacular, no qual o ilusionismo das tramas e do discurso é completamente negado. A opacidade discursiva estaria ligada ainda ao desejo da Verdade - perseguida a todo instante pelo olhar pixelante -, mas no sentido de que esta, inefável, estaria sendo perdida e emulada por códigos sociais arcaicos ditados por uma indústria de costumes, de refrões musicais repetidos ao infinito por famílias patéticas.
Os integrantes do REM têm suas presenças de astros minimizadas ao se tornarem meras "personagens", tendo o mesmo valor das restantes, ao mesmo tempo em que, se incluindo nas imagens, denotam a autocrítica dirigida à representação midiática. Há sentido em chamar estes tipos de "personagens", pois há tramas potenciais e a individualização através de características sociais bastante marcadas pelo cinema e imagens figurativas. A maioria dessas personagens canta a música como se a dublassem, causando a sensação de contradição entre a figura de quem enuncia a crítica e a figura de quem representa o foco de tais críticas. Assim a obra planta nos corpos em ação uma espécie de dialética de representação, opaca e transparente, conscientes e inconscientes de seu estado. Nesse sentido a alienação tematizada pela música e pela imagem encontra sua medida justa ao ser formalizada dessa maneira, na qual as próprias personagens enunciam autocríticas sem perceberem. E é nesse paroxismo que o zoom-ciclo vicioso nos surpreende, quando reparamos naquele pequeno detalhe difuso, naquilo que poderíamos chamar de atração eisensteiniana: o espelho refletindo a imagem autônoma. Não seria este o nosso rosto refletido que só saberia repetir o refrão-título? Nós, personagem alienada e participante?

Uma televisão rebelde e abissal é o que Imitation of life nos explode, sutilmente, na cara.


Videoclipe Imitation of life, da banda REM, dirigido por Garth Jennings, 2001, EUA.

8.12.09

VI. Os rebatedores

http://www.youtube.com/watch?v=-bnQYmmmyOM

Tango

Zbig Rybcynski
1980

Bom saber que sempre e em todo o lugar existem aqueles

19.11.09

V. Os rebatedores


Os tecidos internos eram mais reservados do que todo o restante que se estendia em ampla pele luminosa. No Dentro havia órgãos discretos e pontuais, oxigenados e emaranhados por células que se estendiam também como as partes de Fora, mas agora em um rio de Explosão, combustível de Impressões Atômicas.

15.11.09

IV. Os rebatedores

Escuridão, negar-se a rebater.

Todos mais tranquilos, se abrindo a conversar, candescentes. Os faróis dos carros não são infinitos, então Decoram as ruas em suas precipitações. Negativo do agora. Os tempos simultâneos se sobrepondo no caos da ausência da imagem única, vem à tona a imagem dupla dos Tempos: este livro no silêncio e na nova cadência é o Livro de todos os tempos; esta coxa à luz de velas na nova candela é a Coxa de todas as coxas.

Intuição bastante simplezinha: No escuro os míopes se vingam.